Meu Imóvel Foi Penhorado na justiça: O Que fazer?
- Bruno Naide Lopes Gomes
- 28 de set.
- 11 min de leitura

Receber uma notificação judicial informando que seu imóvel foi penhorado é, sem dúvida, um dos momentos mais angustiantes e aterrorizantes que um proprietário pode enfrentar.
A palavra "penhora" ressoa com um peso de finalidade, um carimbo burocrático que parece decretar que tudo está perdido.
A mente, em um turbilhão de pânico, dispara perguntas que cortam a alma:
“Vou perder a minha casa?” “Para onde minha família e eu vamos?” “Existe algo, qualquer coisa, que eu possa fazer para reverter isso?”
A primeira coisa que você precisa saber é: respire fundo.
Embora a situação seja de extrema seriedade e exija ação imediata, a penhora não é o fim da linha. Ela não é a perda automática e instantânea do seu lar. Pense nela como um alarme de incêndio ensurdecedor: ele indica um perigo grave e iminente, mas também lhe dá a chance de agir de forma estratégica para apagar o fogo antes que ele consuma tudo. A penhora é um ato de garantia dentro de um processo judicial, uma etapa intermediária, e não a sentença final.
Este artigo foi elaborado para ser o seu guia de primeiros socorros jurídicos. Meu nome é Bruno Naide, e como advogado com atuação nacional, meu objetivo é desmistificar o jargão legal e iluminar o caminho que se estende à sua frente. Vamos explicar de forma clara o que a penhora realmente significa e, mais importante, quais são os camosos, as ferramentas e as linhas de defesa que você pode – e deve – acionar AGORA para proteger seu patrimônio.

Lembre-se, este conteúdo é informativo e abrangente, mas não substitui a análise detalhada e personalizada do seu caso. A definição da melhor estratégia de defesa depende de uma consulta aprofundada com um advogado especialista em direito imobiliário e processual.
Capítulo 1: Decodificando a Penhora de um imóvel – O Que Ela é (e o Que Não é)

Para construir uma defesa sólida, o primeiro passo é entender com precisão o que está acontecendo. A falta de conhecimento gera pânico, e o pânico leva à inércia ou a decisões equivocadas.
O Que é a Penhora, Exatamente?
Em termos simples e diretos, a penhora é um ato judicial que "reserva" o seu imóvel para garantir o pagamento de uma dívida que está sendo cobrada na justiça. Imagine que o sistema judiciário coloca uma etiqueta de "reservado para pagamento" no seu bem.
O imóvel ainda é seu: A propriedade continua registrada em seu nome. Você ainda é o dono.
A posse, em geral, continua com você: Você não precisa desocupar o imóvel neste momento.
Porém, há uma restrição crucial: O bem fica vinculado àquele processo específico. Isso significa que você não pode vendê-lo, doá-lo ou transferi-lo para terceiros. Qualquer tentativa de fazer isso sem autorização judicial pode ser considerada fraude à execução, um ato grave com consequências sérias.
Essa "reserva" é formalizada por meio de um termo de penhora nos autos do processo e, fundamentalmente, pela averbação na matrícula do imóvel junto ao Cartório de Registro de Imóveis competente. Essa averbação torna a penhora pública, impedindo que qualquer possível comprador alegue desconhecimento da dívida.
O Que a Penhora Não é?
Não é a perda da propriedade: A transferência de propriedade só ocorre muito mais à frente, após um eventual leilão bem-sucedido e a expedição da respectiva carta de arrematação.
Não é uma ordem de despejo: A questão da desocupação do imóvel só surge após a conclusão do leilão e a transferência da propriedade para um novo dono (o arrematante), que então precisará de uma ordem judicial específica (mandado de imissão na posse) para requerer a sua saída.
Entender essa distinção é vital. Entre a penhora e a perda definitiva, existe um caminho processual com prazos, ritos, avaliações e, o mais importante, diversas oportunidades para apresentar uma defesa robusta.
Capítulo 2: A Linha do Tempo do Processo – O Caminho Entre a Penhora do imóvel na justiça até o Leilão do imóvel

Após a formalização da penhora, o processo não corre para o leilão da noite para o dia.
Existe uma sequência de atos processuais que precisam ser cumpridos, e cada um deles representa uma janela de oportunidade para a sua defesa.
Passo 1: A Intimação da Penhora
Você (e seu cônjuge, se houver) será formalmente intimado sobre a penhora do imóvel. Esta comunicação é um marco fundamental. A partir dela, começam a correr prazos para que você apresente suas defesas. Ignorar esta intimação é o erro mais grave que um devedor pode cometer.
Passo 2: Avaliação Judicial do Imóvel
O juiz nomeará um perito avaliador (geralmente um engenheiro, arquiteto ou corretor de imóveis credenciado) para determinar o valor de mercado do seu imóvel. Este profissional irá inspecionar o bem, analisar suas características, localização, estado de conservação e pesquisar o mercado local para emitir um laudo de avaliação.
Por que este passo é tão crucial? O valor definido neste laudo servirá de base para o leilão do imóvel.
Uma avaliação muito baixa é extremamente prejudicial. Ela facilita a venda do bem por um preço vil (valor muito inferior ao de mercado), diminuindo as chances de sobrar algum valor para você após o pagamento da dívida.
Uma avaliação justa ou alta torna o bem menos atrativo no leilão, pode inviabilizar lances e, caso a venda ocorra, aumenta a probabilidade de um saldo remanescente significativo ser devolvido a você.
Passo 3: A Intimação da Avaliação e o Prazo para Impugnação

Após a entrega do laudo pelo perito, você será novamente intimado para se manifestar sobre o valor apurado. Se você discordar, este é o momento de impugnar a avaliação. Com o auxílio do seu advogado, você pode apresentar laudos de corretores particulares, anúncios de imóveis similares na mesma região e outros documentos que comprovem que o valor de mercado é superior ao apontado pelo perito judicial. O juiz analisará os argumentos e poderá determinar uma nova avaliação ou corrigir o valor.
Passo 4: Designação das Datas do Leilão

Se a dívida não for paga, se não houver um acordo e se as defesas apresentadas não suspenderem o processo, o juiz marcará as datas para o leilão público do imóvel. Aqui, é essencial entender a dinâmica de primeira e segunda praça (ou leilão).
Na primeira praça: O imóvel só pode ser vendido por um lance igual ou superior ao valor da avaliação judicial. Se não houver lances, o leilão é considerado "negativo".
Na segunda praça: Geralmente marcada para poucos dias depois, o imóvel pode ser vendido pelo maior lance oferecido, desde que não seja considerado um "preço vil". A jurisprudência majoritária dos tribunais estabelece que preço vil é qualquer valor inferior a 50% do valor da avaliação.
É neste intervalo de tempo – entre a penhora e a realização do leilão – que sua defesa deve atuar de forma mais estratégica, agressiva e incisiva.
Capítulo 3: O Arsenal de Defesa por advogado especialista em imobiliário – Estratégias e Teses Para Salvar Seu Imóvel do leilão

A pior atitude a se tomar diante de uma penhora é a inércia, a paralisia pelo medo. Agir de forma rápida, informada e estratégica é a chave para virar o jogo. As frentes de ação são variadas e podem ser usadas de forma isolada ou combinada.
Frente de Ação 1: Impenhorabilidade do Bem de Família
Esta é, de longe, a linha de defesa mais poderosa e conhecida para proteger o imóvel residencial. Instituída pela Lei nº 8.009/90, ela visa garantir o direito constitucional à moradia, protegendo o lar da família contra a cobrança da maioria das dívidas.

O que qualifica um imóvel como Bem de Família? O requisito principal é que seja o único imóvel utilizado pela entidade familiar (casal, filhos, pais, etc.) para moradia permanente.
E se a pessoa for solteira, viúva ou divorciada? A proteção se estende. A Súmula 364 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) garante que o conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.
E se o imóvel for de alto padrão? O valor ou o luxo do imóvel, por si só, não afastam a proteção legal. A lei não faz essa distinção.
E se eu alugar o único imóvel que possuo para pagar o aluguel onde moro? Esta é uma dúvida muito comum. A Súmula 486 do STJ pacificou o entendimento de que o único imóvel residencial, mesmo que esteja alugado, continua impenhorável, desde que a renda do aluguel seja comprovadamente utilizada para a subsistência ou moradia da família.
ATENÇÃO: As Exceções à Regra da Impenhorabilidade
Esta proteção, embora ampla, não é absoluta. A própria lei prevê exceções cruciais, e é nelas que muitos credores se baseiam. Seu imóvel PODE SIM ser penhorado e leiloado se a dívida for proveniente de:
Financiamento do próprio imóvel: Dívidas com o banco que financiou a compra do bem (alienação fiduciária ou hipoteca).
Taxas de condomínio: A dívida de condomínio é considerada uma obrigação propter rem (própria da coisa), ou seja, ela acompanha o imóvel. A coletividade de condôminos não pode ser prejudicada pela inadimplência de um.
IPTU e outros impostos do imóvel: Assim como a dívida condominial, os tributos relacionados ao imóvel também são uma exceção.
Pensão alimentícia: A necessidade de garantir o sustento do alimentando se sobrepõe ao direito de moradia do devedor.
Dívida de fiador em contrato de aluguel: Esta é uma das exceções mais polêmicas e dramáticas. O Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que o bem de família do fiador pode ser penhorado para garantir o pagamento de dívidas do contrato de locação que ele garantiu.
Execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real.
Dívida originada de produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória.
Seu advogado precisará analisar se a sua dívida se enquadra em alguma dessas exceções. Caso não se enquadre, e sendo seu único imóvel residencial, a arguição de impenhorabilidade do bem de família deve ser feita imediatamente, pois pode levar à anulação da penhora.
Frente de Ação 2: Análise Criteriosa da Dívida e do Processo
Muitas vezes, a origem do problema pode ser a sua maior arma de defesa. É preciso fazer uma auditoria completa na dívida e no processo judicial.
O valor da dívida está correto? É impressionante a quantidade de processos de execução que contêm erros de cálculo, juros sobre juros (anatocismo), taxas não contratadas e multas abusivas. Uma revisão detalhada por um contador judicial (perícia contábil) pode reduzir drasticamente o montante devido, tornando um acordo mais viável ou, em alguns casos, provando que a dívida já foi paga (quitação).
A dívida já prescreveu? Toda dívida tem um prazo legal para ser cobrada na justiça (prazo prescricional). Por exemplo, a maioria das dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular prescreve em 5 anos. Se o credor demorou demais para entrar com a ação, a dívida pode ser declarada prescrita, e o processo será extinto. Seu advogado deve verificar as datas e a natureza da dívida para analisar essa possibilidade.
Houve falhas graves no processo (nulidades)? O processo judicial é um caminho cheio de regras formais. O desrespeito a essas regras pode anular atos importantes. A principal nulidade a ser verificada é a citação. A citação é o ato pelo qual o devedor é comunicado, pela primeira vez, sobre a existência do processo. Se você nunca foi devidamente citado (por exemplo, a carta de citação foi entregue em endereço errado ou recebida por terceiro estranho), todos os atos posteriores, incluindo a penhora, são nulos. Isso pode fazer o processo retornar à estaca zero.
Frente de Ação 3: Apresentação de Defesas Técnicas Específicas
Além da impenhorabilidade, existem outras teses jurídicas que podem ser aplicadas para desconstituir a penhora:
Excesso de Penhora: Ocorre quando o bem penhorado tem um valor muito superior ao da dívida. Exemplo: a dívida é de R$ 80.000,00 e o imóvel penhorado foi avaliado em R$ 1.000.000,00. Neste caso, o devedor pode pedir ao juiz a substituição da penhora por outro bem de menor valor ou, se possível, a penhora de apenas uma parte do bem. O objetivo é evitar um sacrifício desproporcional do seu patrimônio.
Penhora Incorreta: A penhora recaiu sobre um bem que não pertence ao devedor? Ou sobre um bem que já havia sido vendido a terceiro de boa-fé antes mesmo do processo (mesmo que por contrato de gaveta)? Nesses casos, a defesa correta (embargos de terceiro, por exemplo) pode liberar o bem.
Bem Indivisível com Coproprietário: Se você não é o único dono do imóvel (por exemplo, é herdeiro junto com seus irmãos), a situação muda. O imóvel pode, sim, ser levado a leilão por inteiro, mas a parte do(s) outro(s) proprietário(s) que não tem relação com a dívida deve ser resguardada. O valor correspondente à cota-parte deles, calculado sobre o valor da arrematação, deverá ser entregue a eles.
Frente de Ação 4: A Estratégia Mestra – Negociação de um Acordo

Paralelamente a todas as defesas técnicas, a negociação com o credor deve ser sempre considerada. Lembre-se desta regra de ouro: o credor não quer o seu imóvel, ele quer o dinheiro.
O processo de leilão de um imóvel é demorado, caro e incerto para o credor. Há custos com advogados, peritos, leiloeiro, e sempre existe o risco de o leilão não ter interessados ou de ser anulado por alguma falha processual. Essa incerteza é a sua principal moeda de troca na negociação.
Com uma assessoria jurídica adequada, é possível construir e apresentar uma proposta de acordo que seja vantajosa para ambos os lados:
Proposta de pagamento à vista com grande desconto (deságio): Muitos credores preferem receber 80%, 70% ou até menos da dívida de forma imediata do que esperar anos para talvez receber o valor integral.
Proposta de parcelamento: Apresentar um plano de pagamento realista, que caiba no seu orçamento, demonstrando boa-fé e a intenção de quitar o débito.
Carência: Pedir um prazo de alguns meses para se reorganizar financeiramente e então iniciar o pagamento do acordo.
Um acordo bem-sucedido, uma vez assinado e homologado pelo juiz, suspende e depois extingue o processo, liberando a penhora do seu imóvel e trazendo a paz de volta para sua vida.
Capítulo 4: Perguntas Frequentes – Respostas Diretas Para Suas Dúvidas Mais Urgentes

Posso vender meu imóvel penhorado para pagar a dívida? Não sem autorização judicial e concordância do credor. Vender o bem por conta própria após a penhora pode ser considerado fraude à execução. O caminho correto é seu advogado peticionar no processo, informar sobre a proposta de compra, e pedir autorização para que a venda seja feita, com o valor sendo depositado em uma conta judicial para quitar o débito e o restante sendo liberado para você.
A dívida é muito menor que o valor do imóvel. Vou perder tudo? Não. Se o seu imóvel for leiloado por, digamos, R$ 500.000,00 para quitar uma dívida de R$ 100.000,00 (incluindo juros, multas e custos do processo), o valor da dívida será pago ao credor e o saldo remanescente (R$ 400.000,00, no exemplo) será devolvido a você. Por isso a importância de lutar por uma avaliação justa do imóvel.
O que acontece se ninguém der lance no leilão do imóvel? O leilão é considerado "deserto". O credor tem então algumas opções: ele pode pedir para que o bem seja transferido para o nome dele como forma de pagamento (adjudicação), pode pedir a designação de novas datas para um novo leilão, ou pode indicar outros bens do devedor para serem penhorados.
Até quando posso tentar um acordo? Perdi o prazo? Teoricamente, um acordo pode ser feito a qualquer momento antes da assinatura da carta de arrematação pelo juiz (o documento que formaliza a propriedade do arrematante). Contudo, seu poder de barganha diminui drasticamente à medida que o leilão se aproxima. O melhor momento para negociar é o quanto antes.
Preciso sair do imóvel imediatamente após o leilão? Não imediatamente. Após o leilão e o registro da carta de arrematação, o novo proprietário (arrematante) precisará entrar com um pedido judicial para ser imitido na posse. O juiz expedirá um mandado, e um oficial de justiça irá notificá-lo para desocupar o imóvel em um prazo determinado. Se houver recusa, a desocupação forçada (despejo) poderá ser autorizada.
Conclusão: Da Angústia à Ação Estratégica

A notificação da penhora é um sinal de alerta máximo, um chamado urgente à ação. Não é uma sentença. Como vimos, existe um campo vasto de possibilidades defensivas, desde a proteção do bem de família até a minuciosa auditoria da dívida e do processo, passando pela sempre presente possibilidade de um acordo estratégico.
O pior inimigo neste momento não é o credor, nem o juiz, mas a passividade. Cada dia de inércia é um dia a menos que você tem para construir sua defesa, para encontrar erros processuais, para negociar em posição de força.
A complexidade das leis e dos ritos processuais torna a presença de um advogado especialista não apenas recomendável, mas absolutamente indispensável. Tentar navegar por essa tempestade sozinho é uma aposta de altíssimo risco com o seu bem mais valioso. Um profissional qualificado saberá analisar cada detalhe do seu caso, identificar as teses de defesa aplicáveis e traçar o plano de batalha mais eficaz.
A penhora é o momento de trocar o medo pela estratégia, a angústia pela ação. O conhecimento que você adquiriu neste guia é o primeiro passo. O próximo, e mais crucial, é procurar ajuda especializada para analisar todas as variáveis e lutar pela proteção do seu lar e da segurança da sua família. A estratégia correta, aplicada no tempo certo, pode ser a diferença entre a perda do seu patrimônio e a solução definitiva da dívida.
Autor:
BRUNO NAIDE - Advogado, Graduado em Direito pela Pontícia Universidade Católica do Estado de Goiás; é pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade Católica do Estado de Goiás.
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